Em recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça condenou um pai que abandonou materialmente o filho, a indenizá-lo pelo dano moral causado. Isso porque é responsabilidade de seus genitores garantir o desenvolvimento da criança e fornecer recursos que permitam essa evolução.
Dra. Renata Nery
Ele recorreu ao STJ depois de ser condenado em primeiro e segundo graus a dar uma casa mobiliada ao seu filho, um computador, uma impressora e pagar R$ 35 mil de indenização por danos morais. A condenação tomou como base o artigo 186 do Código Civil, que define como ilícito a prática daquele que, "por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral".
O pai alegou na ação que não há previsão legal para indenização por abandono material e que a responsabilidade civil subjetiva não pode ser aplicada ao caso, pois resultaria em monetarização das relações familiares. Disse ainda que conviveu com o filho até os seis anos de idade, quando a guarda do menor foi transferida para a mãe.
Já a mãe do menor alegou que conviveu por vários anos com o pai do menor, mas que, após o nascimento da criança, ela separou-se dele. Segundo a genitora, depois que ficou responsável pelo filho, seu ex-companheiro deixou de visitá-lo, não contribuiu para as despesas do garoto, pagando pensão apenas quando acionado judicialmente em virtude de ameaça de prisão.
Ela disse que não tem dinheiro suficiente para sustentar a criança sozinha e que muitas vezes eles não têm o que comer, o que vestir ou onde dormir, vivendo praticamente em miséria, apesar de o pai da criança ter mais 1,4 mil hectares de terra, onde planta arroz, além de terrenos e várias cabeças de gado.
O artigo 1.566 do Código Civil define que são deveres dos cônjuges o "sustento, guarda e educação dos filhos". Já o dispositivo 1.568 do mesmo diploma legal define que os genitores devem sustentar a família e educar os filhos na proporção de suas possibilidades.
Em complemento a isso, artigo 1.579 do Código Civil detalha que o divórcio do casal não acaba com a responsabilidade dos filhos. E, por fim, o artigo 4o do Estatuto da Criança e do Adolescente delimita ser dever da família, da comunidade, da sociedade e do poder público assegurar os direitos dos menores de idade.
O relator do processo destacou em seu voto ser evidente o fato de que o pai da criança tem condições para sustentá-la, mas não o faz. "O dever de convivência familiar, compreendendo a obrigação dos pais de prestar auxílio efetivo, moral e psíquico aos filhos, além de assistência material, é direito fundamental da criança e do adolescente. O descumprimento voluntário do dever de prestar assistência material afeta a integridade física, moral, intelectual e psicológica do filho, em prejuízo do desenvolvimento sadio de sua personalidade e atenta contra a sua dignidade, configurando ilícito civil e, portanto, os danos morais e materiais causados são passíveis de compensação pecuniária", explicou.
Ele também ponderou que, apesar de a falta de afeto não ser considerada um ato ilícito, ela se torna um problema quando prejudica "o dever jurídico de adequado amparo material".
É válido lembrar que esta obrigação não se confunde com a pensão alimentícia ou o abandono afetivo. No caso, segundo a Corte, o comportamento do pai, detentor de muitas posses, deixou de prestar assistência ao filho, conduzindo-o à penúria, humilhações, situações que o levaram ao ridículo, privações que prejudicaram o seu desenvolvimento ao qual ficou submetido em decorrência da conduta omissiva do genitor, que tinha conhecimento da situação de penúria e plenas condições de suprir suas necessidades.
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* RENATA NERY – advogada e jornalista. Pós-graduada em Direito Processual Civil pela Universidade Cândido Mendes (UCAM), e em Comunicação Empresarial pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), tendo ainda realizado curso de Direito Público na Fundação Escola Superior do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (Femperj).