
Imagine-se numa festa de aniversário ou em um evento infantil. Sua filha menor brinca com outra criança e, em determinado momento, as duas se desentendem e começam a discutir. A sua filha puxa o cabelo da amiga que, chorando, vai contar o ocorrido para a mãe dela.

Dra. Renata Nery
Vendo o desespero da criança, a mãe vai até o local onde estava sua filha e dá um tapa no rosto dela, além de agredi-la verbalmente.
Provavelmente esta cena já deve ter acontecido com você ou com algum parente, amigo ou conhecido. Mas como provar que realmente ocorreu a agressão do adulto contra o menor?
A agressão sofrida pela criança não precisa ser demonstrada com provas para caracterizar o dano moral. Basta a prática do ato.
Assim entendeu a 3ª. Turma do Superior Tribunal de Justiça ao rejeitar recurso especial de uma mulher condenada a pagar R$ 4 mil de indenização a uma criança, representada por sua mãe no processo, por ter sido agredida e ofendida pela mãe de uma colega em uma festa de aniversário. A decisão foi unânime.
A briga ocorreu em 2015, quando a criança tinha dez anos. Ela teria sido puxada pelo braço pela mãe de uma colega e, ao reagir, tentando mordê-la, recebeu um tapa no rosto. A mãe da colega ainda teria dito: "Isso é para você nunca mais bater na minha filha". No processo, a mãe alegou estar abalada emocionalmente no momento, além de legítima defesa.
Neste caso, os ministros do STJ entenderam que não era preciso haver a comprovação de sofrimento para o pagamento de indenização. O que se percebe é a substituição da prova de prejuízo moral pela sensibilidade ético-social, nem muito reativa a qualquer estímulo ou tampouco insensível ao sofrimento alheio. Ainda que tenha uma percepção diferente do mundo e uma maneira peculiar de se expressar, a criança não permanece alheia à realidade que a cerca, estando igualmente sujeita a sentimentos como medo, a aflição e a angustia.
A violência de um adulto contra uma criança ou adolescente já basta para configurar o dano moral. Isto porque as crianças necessitam de cuidados especiais e gozam de proteção irrestrita dos direitos da personalidade, introduzidos na nossa cultura jurídica através da Constituição Federal e do Estatuto da Criança e do Adolescente.
O art. 227 da CF/88 determina como dever da família, da sociedade e do Estado “assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem com absoluta prioridade, o direito à vida, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
A Lei 8.069/90 (ECA) estabelece, em seu art. 17, que “o direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.
Assim, é assegurada a primazia do interesse das crianças e dos adolescentes, com a proteção integral dos seus direitos.
Diante disso, conclui-se que a agressão, verbal ou física, de um adulto contra uma criança ou adolescente, geral dano moral independentemente de prova e caracteriza atentado à dignidade dos menores.
Gostou do post? Tem alguma dúvida ou quer sugerir um tema? Fique à vontade para mandar uma mensagem para adv.renatanery@gmail.com
* RENATA NERY – advogada e jornalista. Pós-graduada em Direito Processual Civil pela Universidade Cândido Mendes (UCAM), e em Comunicação Empresarial pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), tendo ainda realizado curso de Direito Público na Fundação Escola Superior do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (Femperj).
